Duas mortes marcam reintegração de posse em fazendas de Rondônia

Polícia Militar afirma troca de tiros, enquanto CPT denuncia 'caçada humana' durante desocupação em Machadinho do Oeste

22/11/2025 às 00:05
Por: Redação

Na quinta-feira (20), duas pessoas foram mortas em Machadinho do Oeste, Rondônia, durante uma operação de reintegração de posse de quatro fazendas pertencentes ao grupo Nelore Di Genio. Os irmãos Alex Santos Santana e Alessandro Santos Santana, que participavam da ocupação com centenas de famílias, foram baleados por policiais militares, um evento que gerou versões conflitantes entre a Polícia Militar (PM) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT). A ação resultou na desocupação das propriedades, parte do espólio do empresário João Carlos Di Genio, fundador da Unip/Objetivo.

 

A Polícia Militar de Rondônia comunicou que os irmãos Santana foram atingidos fatalmente após uma alegada troca de tiros com agentes do Batalhão de Choque que patrulhavam uma área já liberada pelos sem-terra. Contudo, fontes ligadas à CPT, em declarações à Agência Brasil, contestam veementemente o relato oficial, acusando a PM de perseguir os ocupantes mesmo após o início da saída voluntária das fazendas, em cumprimento a uma decisão judicial. Este embate de narrativas sublinha a complexidade e a tensão da situação agrária na região.

 

Detalhes do Confronto Segundo a Polícia

A versão da Polícia Militar indica que os agentes estavam em patrulhamento na Rodovia RO-133, com o objetivo de prevenir uma nova ocupação da área, que os sem-terra reivindicam para reforma agrária. Foi nesse contexto que avistaram um veículo Renault Clio em alta velocidade, ocupado pelos irmãos Santana. A PM afirma que, após ignorarem a ordem de parada, os ocupantes do carro atiraram contra as guarnições durante a perseguição, levando à reação policial.

 

A perseguição continuou até que o veículo fosse cercado por outras viaturas. Segundo o relato policial, ao tentar se esconder em uma área de mata, o carro atolou em areia fofa. Nesse momento, dois indivíduos armados, supostamente os irmãos Santana, teriam desembarcado e disparado novamente contra os policiais, configurando um segundo confronto armado que motivou a resposta das guarnições.


"A conduta dos envolvidos, ao desobedecer a ordens legais e disparar contra agentes públicos, representou um grave risco à coletividade e à ordem pública, justificando a intervenção da guarnição", declarou a Polícia Militar.


 

Os irmãos Alex e Alessandro Santana foram encontrados caídos no matagal, com um deles baleado no peito e o outro com um ferimento grave na perna. Ambos foram levados ao Hospital Municipal de Machadinho, mas não resistiram aos ferimentos. A polícia assegura ter apreendido duas armas de fogo e munição utilizadas pelos irmãos. Contudo, a Perícia Criminal admitiu não conseguir comparecer ao local, mesmo após a remoção dos corpos, devido à distância e ao histórico de conflitos na área, o que levanta questionamentos.

 

A Contestação da Comissão Pastoral da Terra

Josep Iborra, assessor agrário da CPT, conhecido como Zezinho, descreveu a execução da decisão judicial de reintegração de posse das fazendas Maruins, Santa Maria, São Miguel e São Vicente como uma "caçada humana" contra os sem-terra. Ele relatou que as 440 famílias desocuparam as fazendas de forma pacífica, mas foram forçadas a abandonar todos os seus pertences, permanecendo dispersas nas imediações, escondidas no mato e sem destino certo, refutando a ideia de que desejavam reocupar a área.

 

Zezinho enfatizou que a desocupação das propriedades do Grupo Di Genio, que os sem-terra argumentam serem terras públicas griladas, iniciou-se sem prévia notificação aos envolvidos. Além disso, não houve apresentação de um Plano de Desocupação, conforme exigido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para ações possessórias coletivas, e a operação contou com um aparato desproporcional, incluindo dezenas de viaturas policiais, helicópteros e até um carro blindado, apesar de as ordens judiciais terem sido emitidas entre 30 de maio e 3 de outubro por juízes do Tribunal de Justiça de Rondônia.


"Segundo os sem-terra, não houve troca de tiros. Os corpos foram levados para o hospital, e o cenário das mortes não foi preservado para a perícia", afirmou o assessor da CPT, Josep Iborra, conhecido como Zezinho.


 

A CPT, órgão ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), acionou diversas entidades, incluindo o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, a Ouvidoria Agrária Nacional e os Ministérios Públicos estadual e federal. O objetivo é que esses órgãos acompanhem a situação de perto e busquem uma solução para o conflito, garantindo que as circunstâncias das mortes de Alex e Alessandro Santana sejam plenamente esclarecidas, haja vista a não preservação do local e a ausência da perícia.

 

Em resposta às críticas, a Polícia Militar de Rondônia reiterou seu dever legal de proteger os oficiais de Justiça no cumprimento das reintegrações de posse. A corporação manteve a versão de que os irmãos Santana reagiram violentamente à abordagem, justificando a intervenção policial. A PM assegurou que o Batalhão de Choque permanecerá na região para "restabelecer a ordem e a paz social" durante a continuidade da Operação Reintegração de Posse Grupo Di Genio.

 

Os advogados que representam o Grupo Di Genio informaram à Agência Brasil que as fazendas de Machadinho do Oeste têm sido alvo de sucessivas invasões desde o ano anterior. Isso levou o grupo a mover ações civil e criminal na Justiça estadual, buscando não apenas a reintegração de toda a área, que afirmam ser produtiva, mas também a reparação de danos atribuídos aos sem-terra, alegando que os invasores estariam desmatando vegetação nativa, extraindo madeira ilegalmente, construindo barracos e loteando a propriedade com intenção de revenda.

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